101 ANOS DE FUNDAÇÃO DA 3ª INTERNACIONAL
No dia 24 de janeiro de 1919, o Comitê
Central do Partido Comunista Russo (novo nome do Partido Bolchevique), junto
das direções dos partidos comunistas de diversos países que estavam na Rússia
Soviética, como Partido Socialista Operário norte- americano, Partido Comunista
húngaro, polonês, alemão, letão, austríaco, finlandês e mais a Federação
Socialista Balcânica, lançam um impactante chamado ao primeiro congresso da
nova internacional revolucionária dos trabalhadores. Estava nascendo a III
Internacional, ou Internacional Comunista. O chamado lançado pelos partidos
comunistas, explicita a necessidade imperiosa de uma nova internacional, que
correspondesse à nova etapa que adentrava a sociedade burguesa, marcada
profundamente pela formação e acirramento dos monopólios e dos cartéis de
grandes grupos capitalistas. Essa etapa da sociedade burguesa foi caracterizada
de forma clássica por Vladimir I. Lenin, no livro Imperialismo,
Fase Superior do Capitalismo, de 1917.
Após a completa degeneração da II
Internacional e dos partidos socialdemocratas reformistas que a compunham,
sobretudo o partido socialdemocrata alemão de Karl Kaustsky, que havia apoiado
a Primeira Guerra Mundial imperialista, os revolucionários internacionalistas
fortemente influenciados pela revolução russa de 1917, dirigida por Lenin e
Trotsky, percebem a importância da criação de uma nova internacional, que
combateria mundialmente o capitalismo de forma orgânica e centralizada.
Segundo o chamado de fundação da III
Internacional:
“Os partidos e organizações abaixo-assinados
consideram como uma necessidade imperiosa a reunião do primeiro congresso da
nova Internacional revolucionária. Durante a guerra e a revolução, não somente
se manifestou a completa bancarrota dos velhos partidos socialistas e
socialdemocratas e com estes a da II Internacional, como também a incapacidade
dos elementos centristas da velha socialdemocracia na ação revolucionária. Ao
mesmo tempo se distinguem os contornos de uma verdadeira Internacional
revolucionária”.
Os doze pontos elaborados pela direção da
Internacional, descrevem as táticas e condutas dos partidos socialistas e
comunistas que a integravam. No chamado, fica patente a necessidade da
derrubada do capitalismo, que adentrava numa época de crises agudas e
decomposição e que a tarefa do proletariado revolucionário era a tomada do
poder pelos trabalhadores contra a burguesia decadente internacionalmente.
O 1.º Congresso da nova Internacional, se
reuniu na Rússia soviética, entre os dias 2 e 6 de março de 1919 e se deu em
meio à Guerra Civil que o imperialismo levava adiante contra a pátria revolucionária.
No discurso de abertura do Congresso, Lenin afirmava: Por mandato do
Comitê Central do Partido Comunista Russo, declaro aberto o primeiro congresso
da Internacional. Antes de mais nada, lhes peço que nos levantemos para honrar
a memória dos melhores representantes da III Internacional: Karl Liebcknecht e
Rosa Luxemburgo”. Esses dois gigantes do proletariado haviam sido
assassinados recentemente pela socialdemocracia alemã. Os bolcheviques,
sobretudo Lenin e Trotsky, sabiam muito bem que sem a expansão da revolução
proletária pelos principais países da Europa, a revolução poderia ser
estrangulada pelas forças do capital imperialista, pois a Rússia soviética
continuaria isolada em meio ao mar capitalista.
Segundo retrospecto de Lenin no 3.º Congresso
da Internacional: “Compreendíamos perfeitamente que a vitória da
revolução era impossível [em nosso país] sem o apoio da revolução internacional
e mundial. Tanto antes como depois da revolução, pensávamos: ou a revolução
acontece, se não imediatamente, pelo menos muito em breve nos outros países
mais desenvolvidos do ponto de vista capitalista, ou então estaremos condenados
a perecer”.
Dessa forma, como bem disse Zinoviev: “Desde
seu nascimento a III Internacional liga seu destino ao da Revolução Russa”.
Diferente da I Internacional de Marx e
Engels, que possuía um caráter de frente única entre diversas tendências do
movimento operário, como comunistas, socialistas, anarquistas,
sindicalistas, etc., e da II Segunda Internacional, que era uma espécie
de federação de partidos socialdemocratas e socialistas, a Terceira funcionava
de acordo com os critérios do centralismo democrático, defendido por Lenin em
sua concepção de partido operário. Ou seja, baseado na experiência da Revolução
de Outubro de 1917 e na nova etapa da mundialização do capital imperialista, a
III Internacional foi formada como um partido mundial da revolução socialista,
um agente e guia internacional da derrubada do capitalismo.
Os primeiros quatro congressos da
Internacional Comunista significaram um profundo avanço programático para a
luta dos trabalhadores. Nestes estão inseridos a luta contra o oportunismo, o
sectarismo, o ultra esquerdismo, a Frente Única, além de importantes resoluções
quanto à questão da mulher, dos negros, da luta dos povos semicoloniais e
coloniais, mas também do trabalho dos comunistas nos sindicatos e nas fábricas.
Na resolução sobre a tática, por exemplo,
votada no Terceiro Congresso em junho de 1921, se percebe uma atualidade
irretocável: “(...) é necessário tomar cada necessidade das massas
como ponto de partida da luta revolucionária, que em seu conjunto poderá
constituir a corrente poderosa da revolução social. Porém, para realizar essa
tarefa, os partidos comunistas devem propor as reivindicações cuja realização constituem
uma necessidade imediata e urgente para a classe operária e devem defender
essas reivindicações nas lutas de massas, sem se importar em saber se são
compatíveis ou não à exploração agiota da classe capitalista”.
A degeneração stalinista
O período do Termidor soviético, conforme
definido por Leon Trotsky no capítulo V do livro A Revolução de
Traída de 1936, como “a vitória da burocracia sobre as
massas”, foi cruel para a sobrevivência da Internacional Comunista. O
agravamento das condições de saúde de Lenin, o isolamento do Estado operário
sabotado economicamente pelo mundo capitalista, os estragos causados pela
Guerra Civil, o abatimento das massas, entre outros fatores, favoreceu o avanço
da burocratização do Estado operário soviético, do Partido Comunista Russo, mas
também e, fundamentalmente, da Internacional.
A política reacionária do “socialismo em um
só país”, que expressava o conservadorismo da casta burocrática encabeçada por
Stalin, dominou a política da Internacional Comunista desde a morte de Lenin.
Em 1927, a
política de colaboração de classes levada adiante pela burocracia, levou à
derrota da revolução chinesa: Stalin e toda a direção da Internacional
burocratizada submeteu o partido comunista chinês ao nacionalismo burguês do
Kuomitang, dirigido por Chiang Kai-Shek, que em seguida promoveu um massacre
contra os revolucionários.
Nessa época, a burocracia rompendo com a da
Frente Única, votada no IV Congresso da Internacional, passou a defender as
Frentes Populares, que amarravam o proletariado às burguesias ditas
“progressistas”, levando à diversas derrotas dos trabalhadores. Em seguida, nos
anos de 1930, dando um giro qualitativo, a direção termidoriana entra no seu
“terceiro período”, caracterizado por um ultra esquerdismo extremado, não menos
nocivo que seu apoio às Frentes Populares.
Igualando a socialdemocracia ao fascismo, a
“teoria” stalinista do “social-fascismo” se negava, mesmo na iminência do
perigo nazista, em articular a frente única do Partido Comunista alemão com os
trabalhadores socialdemocratas, facilitando dessa forma a subida de Hitler ao
poder e abrindo anda mais o caminho para a Segunda Guerra Mundial, levando
Trotsky a declarar morta a Internacional Comunista e a criar a IV
Internacional, baseada nos quatro primeiros congressos da Terceira.
Após a Segunda Guerra Mundial Stalin, levando
adiante a política de coexistência pacifica com o imperialismo, dissolveu
oficialmente a III Internacional, mostrando à burguesia mundial sua disposição
em ser um freio contra a revolução proletária e um dos sustentáculos da ordem
burguesa.
Apesar da burocratização e traição
stalinista, a III Internacional além de extremamente atual e necessária, ficará
para sempre como um exemplo de combate e da necessidade da luta internacional
intransigente do proletariado revolucionário contra a burguesia e o
imperialismo, um verdadeiro legado de nossos heroicos camaradas que a fundaram,
sobretudo os bolcheviques dirigidos por Lenin e Trotsky. Neste sentido,
reivindicamos seus quatro primeiros congressos como patrimônio da classe
trabalhadora mundial!
A necessidade do combate internacional contra o capitalismo
O internacionalismo proletário, ou seja, a
união internacional dos trabalhadores para a sua luta política contra o
capital, constitui-se num dos princípios fundamentais do socialismo cientifico.
Surge mesmo, do caráter cada vez mais internacionalizado da economia
capitalista e das suas forças produtivas, muito diferente da sociedade feudal
ou agrária pré-capitalista, que mantinha uma estrutura fragmentada baseada em
pequenos Estados, além de relações sociais e políticas estreitas, que impediam
de fato o desenvolvimento das forças produtivas.
De acordo com Marx e Engels:
“Impelida pelas necessidades de mercados
sempre novos, a burguesia invade todo o globo terrestre. Necessita
estabelecer-se em toda parte, explorar em toda parte, criar vínculos em toda
parte.” (Manifesto Comunista de 1848).
Dessa forma, se o regime capitalista tende para a mundialização de suas
relações de produção e se o capital desloca geograficamente e constantemente
suas contradições, a luta dos trabalhadores possui em essência um caráter
internacional contra a burguesia.
Podemos observar este fato empiricamente nos
dias atuais, na chamada “globalização neoliberal”. Na atual fase do
capitalismo, marcada pela completa desregulamentação da circulação de capitais
por parte dos Estados burgueses modernos, as grandes empresas multinacionais
têm deslocado constante e permanentemente seus empreendimentos pelo globo, em
busca de baixos salários, condições degradantes de labor, benefícios fiscais
por parte dos Estados nacionais e etc., que na prática e em última instância
barateiam os custos de produção e incrementam as condições de concorrência por
parte dos grandes monopólios. Mas do outro lado da moeda, põem os operários na
defensiva, acirram a concorrência entre os proletários de diversos países e
precarizam e degradam as condições mais básicas de sobrevivência dos
trabalhadores, sobretudo nos países dependentes e semicoloniais da Ásia, África
e América Latina.
Um acontecimento histórico atual, que deixa
bem claro o fato de que, no capitalismo, as lutas de classes, assim como as
relações de produção burguesas e as forças produtivas, ultrapassam seus limites
nacionais, mesmo no terceiro mundo onde ocorrem lutas nacionalistas e
anti-imperialistas. Na Venezuela, por exemplo, é possível observar de
forma clara e objetiva, como as forças do capitalismo internacional atuam em
conjunto para levar adiante seus interesses de pilhagem colonial entre as
diversas facções da burguesia imperialista. Se não for socorrida pelo
proletariado internacional, em primeiro lugar da América Latina, as massas
venezuelanas terão sérias dificuldades em resistir ao criminoso assédio
imperialista, articulado internacionalmente. O exemplo venezuelano possui todo
um valor pedagógico para os trabalhadores: a burguesia, apesar de suas
contradições, sempre que necessário e quando se trata de defender seus
interesses de classe atua para si em nível internacional contra os
trabalhadores e estes só podem responder de forma efetiva também na arena da
luta de classes internacional.
Essa rotatividade internacional do capital
está diretamente conectada à fase imperialista da economia mundial burguesa,
onde predomina a exportação de capital em detrimento à de mercadorias. Como nos
diz Lenin: “O que caracteriza o antigo capitalismo, onde reinava a
livre concorrência, era a exportação de mercadorias. O que caracteriza o
capitalismo atual, onde reinam os monopólios, é a exportação de capitais.” (Imperialismo,
Fase Superior do Capitalismo).
Assim sendo, a burguesia, apesar das
profundas contradições em seu interior, utiliza como escudo contra a luta
nacional dos trabalhadores, a internacionalização das forças produtivas e o
deslocamento de suas contradições no interior dos Estados nacionais para a
arena da economia mundial. Dessa forma, a luta dos trabalhadores para ter êxito
contra o capital necessita ser internacional. Como diz o filósofo trotskista
George Novack, citado no livro de Alicia Sagra, História das
Internacionais Socialistas, editora Sunderman, de 2005:
“O internacionalismo não é um dogma, nem um
sonho, nem uma ideia sentimental, impossível de realizar. Para os
materialistas, o internacionalismo é o reconhecimento e a compreensão da
realidade e das necessidades da civilização contemporânea. Estas bases
materiais sociais da economia mundial constituem os verdadeiros fundamentos do
internacionalismo marxista.”.
A atual e profunda crise orgânica pelo qual
passa a sociedade burguesa em todo o mundo exige uma resposta também
mundializada dos trabalhadores. O grande capital imperialista tem implementado,
na prática, uma ofensiva histórica contra o proletariado em todos os países. Em
nível mundial, a burguesia tem estabelecido um novo padrão de acumulação,
baseado num rebaixamento internacional acentuado do padrão de vida das massas e
na espoliação selvagem de sua existência. A lógica disso é que, o capital tem
conseguido nivelar relativamente e por baixo, a taxa de exploração
internacional dos trabalhadores.
Este processo contrarrevolucionário se
acentuou sobremaneira, com a restauração capitalista na União Soviética e na
China, resultando numa ofensiva brutal tanto econômica e política, como
ideológica, contra o operariado de todos os países.
No entanto, todos os mecanismos de contenção
da resistência operária, estão absolutamente comprometidos devido ao
aprofundamento irreversível da crise global e universalizante, que atinge o
regime burguês em seu conjunto. O regime de acumulação neoliberal colocado em
marcha após a derrocada das políticas econômicas keynesianas, está falido e
esgotado, sendo vetor de profundas e constantes instabilidades no coração da
ordem burguesa.
Com a completa mundialização das forças
produtivas do capital, esgota-se assim suas possibilidades de expansão,
restando ao capital lançar mão de suas forças destrutivas contra a própria
humanidade. Mas por outro lado, as condições materiais para a emancipação dos
trabalhadores e do conjunto da humanidade estão dadas.
Se os trabalhadores vivem uma crise de
direção revolucionária, devemos afirmar com base na realidade objetiva que a
burguesia vive crise pior. Toda a superestrutura da sociedade burguesa está
contaminada pela profunda crise orgânica do regime capitalista, diminuindo
decisivamente as condições das classes dirigentes deslocarem suas contradições
profundas e insolúveis, como lançavam mão num passado distante.
O proletariado tem a vantagem de se encontrar
do lado certo da maré histórica. Como toda a história tem mostrado, os períodos
que antecederam os grandes embates das lutas de classes, foram precedidos por
épocas contrarrevolucionárias. Depois do desgaste dos principais mecanismos de
contenção burgueses, o próximo período será o do ascenso operário, que
necessita urgentemente superar a crise de direção.
Batalhar pela criação dos partidos
revolucionários em cada país é tarefa de suma importância para o proletariado
em seu embate de vida ou morte contra a burguesia no terreno nacional, mas não
basta: a atual época histórica cobra mais do que em qualquer outro período, a
criação do partido mundial da revolução, arma decisiva para o proletariado em
sua luta pela derrubada do capitalismo internacionalmente. Como o grande
revolucionário russo Leon Trotsky nos ensinou em suas teses publicadas no
Epílogo da edição de Sunderman de 2012, de A Revolução
Permanente (de 1930):
“A revolução socialista não pode ser
concluída nos marcos nacionais. Uma das principais causas da crise da sociedade
burguesa reside no fato de que as forças produtivas por ela engendradas tendem
a ultrapassar os limites do Estado nacional. Daí as guerras imperialistas de um
lado, e a utopia dos estados Unidos burgueses da Europa do outro. A revolução
socialista começa no terreno nacional, desenvolve-se na arena internacional e
termina na arena mundial. Por isso mesmo, a revolução socialista se converte em
revolução permanente, no sentido novo e mais amplo do termo: só termina com o
triunfo definitivo da nova sociedade em todo o nosso planeta.”.
Diante da enfermidade de morte que atinge cronicamente a sociedade
burguesa senil, que nada tem mais a oferecer à humanidade, a não ser
desemprego, fome, guerras e destruição, se faz cada vez mais atual o chamado
dos dois gigantes do proletariado internacional Marx e Engels, no Manifesto Comunista: “ Trabalhadores de todos os países, uni-vos!”.
ROBERTO BERGOCI - SP
texto publicado originalmente no jornal
GAZETA REVOLUCIONÁRIA
100 anos da fundação da III Internacional: a atualidade do partido mundial da revolução para barrar o caminho da barbárie imperialista!
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